IBGE: 83% das crianças no país usaram o SUS no último ano, mas serviço precisa melhorar
Pela primeira vez, a levantamento traz informações sobre a qualidade do cuidado infantil nos serviços de Atenção Primária à Saúde
Por Giulia Vidale e Bernardo Yoneshigue — São Paulo
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Em 2022, 31,5 milhões de crianças menores de 13 anos utilizaram algum serviço de atenção primária no Sistema Único de Saúde (SUS), incluindo consultas, exames, vacinação, nebulização, entre outros. Isso corresponde a 82,9% da população brasileira dessa faixa etária e indica o importante alcance desse serviço para a saúde infantil. No entanto, apesar do amplo alcance, a rede ainda está avaliada em uma zona de aperfeiçoamento.
Os números fazem parte da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua), divulgada nesta sexta-feira pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Feito no segundo trimestre deste ano, o levantamento, em parceria com o Ministério da Saúde, avaliou de forma inédita o cuidado infantil prestado pelas equipes profissionais nas unidades de Atenção Primária à Saúde (APS), o que na rede pública inclui locais como as Unidades Básicas de Saúde (UBS) e Unidades da Saúde da Família (USF).
— É o maior levantamento de atenção primária à saúde da América Latina, foram cerca de 211 mil domicílios (visitados na pesquisa). Isso precisa continuar para termos respostas melhores — diz o diretor de pesquisas do IBGE, Cimar Azeredo Pereira, em coletiva de imprensa para divulgar os resultados.
A APS abrange diversos aspectos, desde a promoção e a proteção da saúde, até tratamento, reabilitação e redução de danos. Por isso, ela é considerada a principal porta de entrada do SUS. Analisá-la, portanto, é fundamental para pensar a estruturação de todo o sistema público nacional.
— São resultados (da pesquisa) muito importantes para a atenção primária do Brasil. Isso certamente vai servir para fomentar e nortear as políticas de saúde do ministério — afirma o secretário de Atenção à Saúde Primária da pasta, Raphael Câmara.
Além da adesão à rede, a qualidade do serviço prestado foi avaliada a partir das respostas de pais ou responsáveis pela saúde das crianças com base em dois indicadores: o Net Promoter Score (NPS), que é amplamente utilizado na saúde privada brasileira, e uma versão adaptada do Instrumento de Avaliação da Atenção Primária à Saúde (PCATool), instrumento internacional de pesquisa validado e publicado pelo Ministério da Saúde no Brasil.
— Avaliar a saúde infantil é muito mais difícil que a do adulto. Temos poucos estudos com abrangência nacional. Agora temos uma linha de base para comparar a rede com indicadores de outros países, é um instrumento importante que é pouco usado para a população infantil — analisou o professor do Departamento de Medicina de Família e Comunidade da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), que acompanhou a pesquisa, Luiz Felipe Pinto.
Zona de aperfeiçoamento
Em relação ao NPS, os cuidadores deram uma nota de 0 a 10 para os serviços. Ao fim, levando em consideração a quantidade de respondentes e a proporção de cada resposta, é atribuída uma nota entre -100 e 100. Na pesquisa do IBGE, o resultado foi de 28 para a APS entre as crianças. A nota é positiva, mas indica que o serviço ainda precisa ser aperfeiçoado. Para alcançar a zona de qualidade, seria preciso ultrapassar 51, e a zona de excelência, 76.
— Isso significa que os responsáveis avaliam positivamente, porém eles ainda carecem de aperfeiçoamento. Na metodologia do NPS, trabalhamos com zonas de avaliação. Não estamos na zona crítica, porque o indicador é superior a 0, mas a nota de 28 coloca o serviço numa zona que tornam necessários alguns aprimoramentos — explica a coordenadora de Pesquisas por Amostra de Domicílios do IBGE, Adriana Beringuy.
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Os principais motivos para atribuição das notas foram o acolhimento - forma como o responsável ou a criança foram recebidas no local de atendimento - e a equipe - atuação dos profissionais. Juntos, responderam por cerca de 68% dos motivos citados. Para 23,2% dos cuidadores, o tempo de atendimento influenciou na nota atribuída ao serviço.
— Os principais fatores que pesaram na avaliação, seja positiva ou negativa, foram acolhimento e equipe. Regionalmente, o fator equipe tem uma importância maior no Sudeste e no Sul, enquanto no Norte e Nordeste, a questão do acolhimento oferecido às crianças têm uma relevância maior no processo de avaliação — complementa Adriana.
Na sequência, a pesquisa investigou o cuidado prestado pelo médico durante as consultas. Cerca de 28,4 milhões de crianças, o que corresponde a 75%, passaram por uma consulta médica nos 12 meses anteriores à entrevista. A maior parte dos atendimentos (46,1%) foi realizado em UBS ou USF, seguido de uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA) (20,3%) e rede privada (29,3%).
Os principais motivos para o consulta foram: rotina, como revisão, check-up, acompanhamento do crescimento e desenvolvimento (39,1%); seguido por problemas respiratórios ou de garganta, como gripe, sinusite, amigdalite, faringite, asma, bronquite (30,9%); e outros motivos, como febre, diarreia, vômito, problemas gastrointestinais, acidentes, fratura, lesão, machucado, alergias, etc (30%).
— No Norde e no Nordeste, a busca por consultas de rotina é o que mais motiva a busca. Já no Sul e no Sudeste, foram problemas respiratórios. Isso pode estar relacionado às próprias características climáticas das regiões, que costumam ter temperaturas mais frias, e as crianças são mais propensas aos problemas respiratórios — pontua a coordenadora de Pesquisas por Amostra de Domicílios do IBGE.
O documento ressalta que a pandemia de Covid-19 pode te dificultado o acesso das crianças aos serviços de atenção primária. Mesmo assim, o SUS permaneceu atendendo mais de 80% da população infantil do país.
Nota não é ruim, mas ainda abaixo do desejado
Das 28,4 milhões de crianças que foram ao médico no ano anterior, 11,1 milhões (39,%) realizaram pelo menos uma segunda consulta com o mesmo profissional. Foram os cuidadores dessas crianças que avaliaram o atendimento médico, por meio do PCATool. Eles foram escolhidos por já terem familiaridade com o serviço de saúde prestado em uma unidade de saúde específica.
Nesse outro método de avaliação, mais amplamente utilizado por uma série de países e validado pelo Ministério da Saúde, o Brasil atingiu um escore de 5,7, numa escala que vai de 0 a 10. Isso significa que os serviços ofertados ainda precisam ser aprimorados. Para fator de comparação, um escore de 6,6 indica uma elevada qualidade de atenção à saúde. Nenhuma Unidade da Federação atingiu esse índice individualmente.
— Esse escore mostra que os serviços carecem de um aperfeiçoamento para se alcançar a qualidade que é preconizada para o sistema de saúde do Brasil — diz Adriana. A região que teve melhor avaliação no serviço foi o Sul, com um escore de 6. A pior, foi a região Norte, com um escore de 5,4.
A pesquisa mostrou também quem são os responsáveis por cuidar da saúde dos brasileiros de até 12 anos. Para a maioria das crianças (87,1%) essa função cabe ao pai ou à mãe. Em relação à escolaridade desse adulto, mais de 80% não tem ensino superior completo - 42,9% apenas com ensino fundamental e 40,1% com ensino médio .
No geral, o percentual de crianças cujo cuidador tinha nível superior foi de apenas 17,1%. Nas regiões Sudeste, Sul e Centro-Oeste, o índica foi mais próximo de 20%. Já nas Regiões Norte e Nordeste, a taxa ficou pouco acima dos 10%.
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