Saúde

Por Ricardo Muniz | Agência FAPESP


Duas espécies psicrofílicas foram descobertas por cientistas uruguaios em 2013 e são avaliadas desde 2018 por parceria entre USP de Ribeirão Preto e IIBCE, de Montevidéu — Foto: Instituto de Investigaciones Biológicas Clemente Estable
Duas espécies psicrofílicas foram descobertas por cientistas uruguaios em 2013 e são avaliadas desde 2018 por parceria entre USP de Ribeirão Preto e IIBCE, de Montevidéu — Foto: Instituto de Investigaciones Biológicas Clemente Estable

Uma colaboração científica entre a Universidade de São Paulo (USP) em Ribeirão Preto e o Instituto de Investigaciones Biológicas Clemente Estable (IIBCE) de Montevidéu, no Uruguai, analisa duas novas bactérias, descobertas na Antártida há dez anos, para aplicações na área da saúde, alimentos e recuperação ambiental.

Parte dos resultados foi descrita em março no periódico ACS Synthetic Biology, publicação da American Chemical Society. O uso de bactérias em biotecnologia pode trazer muitos benefícios para seres humanos e meio ambiente por não gerar produtos tóxicos nem depender energeticamente de reservas de petróleo. Elas são organismos microscópicos que têm a capacidade de se adaptar a diversos ambientes e realizar uma variedade de funções importantes. As recuperadas de ambientes extremos da Terra têm características fisiológicas ainda mais interessantes. A Antártida é o continente mais frio do globo, com temperaturas que variam de cerca de -10 °C a -60 °C no inverno, e de -5 °C a -20 °C no verão.

As bactérias com enzimas adaptadas ao frio são chamadas “psicrofílicas”. Enzimas são proteínas que catalisam reações químicas específicas. As produzidas por bactérias psicrofílicas são muito importantes em processos biotecnológicos porque têm uma atividade enzimática elevada mesmo em temperaturas baixas, o que torna seu uso mais econômico e sustentável em relação às produzidas por aquelas provenientes de climas menos rigorosos.

“Como as bactérias isoladas do ambiente são muitas vezes difíceis de ‘domesticar’ em termos de aproveitamento de suas enzimas, estudamos duas bactérias isoladas de um sedimento da Antártida pertencentes ao genus Pseudomonas”, explica María Eugenia Guazzaroni, professora do Departamento de Biologia da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto (FFCLRP-USP), cujas pesquisas são apoiadas pela FAPESP.

“Ambas são novas espécies, ou seja, nunca foram descritas anteriormente. Verificamos se conseguiríamos aproveitar as vantagens de seu metabolismo com nossas ferramentas de edição gênica e pudemos assim estabelecer o funcionamento correto de vários plasmídeos nessas duas bactérias, facilitando seu emprego para expressão de enzimas psicicrófilas em aplicações biotecnológicas”, complementa. Os plasmídeos de expressão são moléculas de DNA usados por cientistas para produzir proteínas específicas. Uma vez introduzido dentro da célula, o plasmídeo é replicado e a proteína é produzida a partir da sequência de DNA presente no plasmídeo.

Aplicações

Os plasmídeos de expressão são amplamente utilizados em pesquisas científicas e em indústrias farmacêuticas e de biotecnologia para produzir grandes quantidades de proteínas recombinantes específicas para desenvolver terapias médicas com hormônios ou anticorpos.

Além disso, as enzimas psicrófilas podem ser utilizadas na produção de alimentos refrigerados, como sorvetes e iogurtes, com melhor qualidade e textura. Outra aplicação é como aditivos em detergente e em sabão de lavar roupa para melhorar a eficácia na remoção de manchas e sujeiras. Essas enzimas têm a capacidade de funcionar em temperaturas mais baixas do que outras, o que significa que podem ser utilizadas em ciclos de lavagem em água fria, economizando energia. Além disso, podem melhorar a qualidade do detergente e do sabão de lavar roupa, prolongando a vida útil dos tecidos, pois reduzem o desgaste durante a lavagem.

As enzimas psicrófilas podem ser usadas ainda em processos de biorremediação para remover poluentes em ambientes frios, como a Antártida.

Colaboração internacional

O trabalho foi realizado em colaboração com cientistas do Uruguai, que descobriram essas novas bactérias em 2013 na Antártida e desde 2018 colaboram com o grupo da USP nessa pesquisa. “Tivemos a visita da Vanesa Amarelle, coautora do artigo, como pós-doutoranda no contexto de uma bolsa de mobilidade de treinamento em institutos de pesquisa no exterior em campos prioritários, concedida pela agência uruguaia de pesquisa e inovação [ANII] em 2018”, conta Guazzaroni, que é doutora em bioquímica e biologia molecular pela Estación Experimental del Zaidín/CSIC, em Granada (Espanha), com pós-doutorados em metagenômica ambiental e metagenômica funcional de ambientes extremos no mesmo país, além de pós-doutorado na USP de Ribeirão Preto.

Além de Guazzaroni e Amarelle, assinam o artigo Diego M. Roldán e Elena Fabiano, do Departamento de Bioquímica y Genómica Microbianas do IIBCE.

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