Governo Lula estuda fim de patentes de medicamento para retaliar EUA, mas vai esperar prazo de Trump

Brasil poderá antecipar fim do período em que há direito de patentes dos fabricantes

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Atualização:

Impacto econômico de tarifa dos EUA sobre Brasil pode ser forte, mas limitado no curto prazo

Tendência é que País redirecione produtos para outros países, como a China; setores como siderurgia e aviação podem ser mais afetados. Crédito: Alvaro Gribel/Estadão

BRASÍLIA — O governo brasileiro está criando um grupo para avaliar de que forma o Brasil atuará reciprocamente em relação aos Estados Unidos, depois que o presidente americano, Donald Trump, anunciou uma sobretaxa de 50% para produtos brasileiros na quarta-feira, 9.

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O Estadão/Broadcast apurou que o grupo ainda está em formação, mas que, com base em avaliações de algumas áreas feitas mesmo antes do comunicado de quarta, é provável que a propriedade intelectual entre na lista, em especial para o caso de medicamentos.

O governo trabalha com o prazo de cerca de 20 dias para responder a Trump, mas considera que seria um “erro” reagir antes do prazo dado pela Casa Branca na carta. Um integrante do governo diretamente ligado ao assunto afirmou que Trump deu um “ultimato” pedindo uma espécie de “rendição” e não indicou na carta nenhuma opção de negociação.

Há a avaliação de que o Brasil possa antecipar, por exemplo, o fim do período em que há direito de patentes dos fabricantes. No caso dos remédios, muitas vezes há direitos exclusivos concedidos a empresas que desenvolvem algumas substâncias e protegem seus produtos por algum tempo determinado, impedindo que terceiros façam a fabricação, a venda ou a distribuição da fórmula sem autorização.

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O grupo formado pelo governo prestará especial atenção, no entanto, aos produtos comprados nos Estados Unidos e que podem servir como insumos para a indústria doméstica. O intuito é o de não aumentar os custos de alguns itens fundamentais para serem transformados em outros produtos aqui. Seria um tiro no pé para a indústria doméstica, conforme uma fonte, colocar respostas automáticas sem avaliar as consequências de produtos que têm características próprias.

Por isso, haverá especial atenção sobre esses produtos. Uma forma de atuação poderia ser via itens que hoje entram na lista de drawback, uma ferramenta que restitui ao exportador impostos alfandegários cobrados pela importação da matéria-prima utilizada na fabricação do produto exportado. Ainda se verá se essa restituição tem condições de ser mantida ou se pode ser retirada, sem prejudicar a manufatura nacional.

Na quarta-feira à noite, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva escreveu na rede social X que “qualquer medida de elevação de tarifas de forma unilateral será respondida à luz da Lei brasileira de Reciprocidade Econômica”.

O texto foi escrito após uma reunião de emergência com o vice-presidente Geraldo Alckmin, também ministro da Indústria, Comércio e Serviços, e os ministros Fernando Haddad, da Fazenda, e Mauro Vieira, das Relações Exteriores. Na nota oficial, Lula afirmou que o “Brasil é um país soberano com instituições independentes que não aceitará ser tutelado por ninguém”.

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Governo reluta em resposta com tarifa geral de 50%

A possibilidade de estabelecer uma tarifa geral que incida sobre todos os produtos norte-americanos como resposta tem sido rechaçada por integrantes do governo, apesar de Lula ter admitido essa possibilidade, em entrevista à TV Record.

O Estadão/Broadcast apurou também que a resposta do governo deve ser “calibrada, seletiva, firme e inteligente”. Interlocutores que participam da discussão sobre o assunto no governo afirmam que o Brasil deve evitar “entrar no jogo” do presidente dos Estados Unidos.

Integrantes do governo ouvidos pela reportagem acreditam que a solução via Organização Mundial do Comércio (OMC) não deve ter grandes impactos de forma efetiva. Integrantes do Planalto avaliam, também, que o governo ainda precisa regulamentar a lei da reciprocidade para ter caminhos para a resposta.

A resposta de Lula na noite de quarta-feira, 10, foi elaborada com seus ministros e auxiliares como uma forma de responder não diplomaticamente (já que o governo brasileiro não tem expectativa em torno de uma negociação com Trump), mas politicamente. Auxiliares do presidente entendem que era preciso dar uma resposta para os bolsonaristas e para a sociedade brasileira.

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O retorno que a resposta de Lula vem tendo animou interlocutores do governo, que veem uma movimentação nas redes sociais contra a tarifa e a favor da soberania brasileira.

Editoriais de veículos de imprensa, como o do Estadão, também têm sido mencionados para argumentar que a resposta do presidente foi no tom correto. A palavra “sobriedade” é a que tem sido usada como síntese da declaração.

O anúncio de tarifa por parte de Trump contra o Brasil não pegou o Palácio do Planalto de surpresa, apesar de o conteúdo da carta apresentada pelo presidente norte-americano ter assustado o governo brasileiro. O principal fator de surpresa foi a inclusão no documento do “fator Bolsonaro”.

A carta de Trump foi vista por integrantes do governo brasileiro como um “ataque” à democracia brasileira pela forma como cobrou o fim do processo sobre Jair Bolsonaro.

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Lula viaja ao Chile no dia 21 deste mês para um encontro com presidentes de esquerda. Integrantes do governo acreditam que a reunião ganhou novos contornos com a tarifa anunciada por Trump contra o Brasil e acreditam que o ataque dos EUA deve entrar nas discussões em Santiago no fim do mês. /Com Gabriel Hirabahasi e Gabriel de Sousa